SINOPSE: Um estudo comparativo entrelaçando literatura e cinema, analisando "Lição de Amor" e "Amar, Verbo Intransitivo", onde, através da lente crítica se desvenda as nuances da adaptação fílmica da expressão literária.
✚APRESENTAÇÃO /
Entre palavras e imagens almejamos tecer nossa análise comparativa de “Lição de Amor”, filme de Eduardo Escorel e “Amar, Verbo Intransitivo”, romance de Mário de Andrade, este artigo prima pela interação e comparação entre as formas literária e cinematográfica, debruçando nosso olhar em recortes utilizados pelo diretor Escorel através da adaptação fílmica e explorando a visão do autor Mário de Andrade através do narrador, e como essas duas obras abordam, ou não, os mesmos temas em diferentes perspectivas, aqui nós enfatizamos a representação visual no filme e a expressão verbal no livro, examinando como cada meio expressa as relações e como escolhe o que será expressado, considerando que o filme é uma adaptação do romance. Portanto, sendo a literatura comparada não apenas sobre encontrar semelhanças e diferenças entre os textos, mas também sobre explorar como essas semelhanças e diferenças podem nos ajudar a entender de forma mais objetiva os textos, os contextos e a sociedade em que foram produzidas. Este artigo, se dará através de uma análise dialética entre livro e filme para em sua síntese demonstrarmos seu impacto sociocultural dentro das áreas do conhecimento e da produção científica contemporânea, não só entendendo mais “sobre a natureza dos elementos confrontados mas, principalmente, para saber se são iguais ou diferentes.” (Carvalhal, 2006, p. 07).
*
✚O FILME /
A obra “Lição de Amor” de 1975 é dirigido por Eduardo Escorel, este filme é baseado no romance “Amar, Verbo Intransitivo” de Mário de Andrade, (deste, retomaremos depois) o qual lhe rendeu o título de Melhor Diretor no Festival de Gramado em 76. O filme é protagonizado por Lílian Lemmertz de "Copacabana Mon Amour", ganhadora do prêmio de Melhor Atriz por este filme também em Gramado, Rogério Fróes de "O Homem do Futuro" e Irene Ravache do excelente "Entre Abelhas"; Já o roteiro do filme fica nas mãos do documentarista Eduardo Coutinho de "Cabra Marcado Pra Morrer" e "Edifício Master".
Nesse sentido, o filme conta com uma ótima produção de arte, desde figurinos e ambientação, “Lição de Amor” consegue nos transportar até São Paulo dos loucos anos 20, onde acompanhamos a governanta alemã Helga sendo contratada pelo patriarca da família burguesa Sousa Costa para dar aulas aos filhos, isso inclui a educação “amorosa” ao filho mais velho, Carlos. Deste modo, o pai busca proteger o jovem das perversidades do mundo que o cerca, ensinando-lhe valores e comportamentos adequados em relação não só ao sexo, mas ao amor, oferecendo-lhe um retrato crítico da sociedade brasileira da década que retrata. O filme se escora muito na sutileza do que é sugerido, mas não explícito, o livro, o qual o filme adapta foi publicado em 1927, então, pensemos que o filme se passe nessa época, ou seja, 38 anos depois da abolição da escravatura, 18 anos depois da imigração Japonesa e 9 anos depois do fim da Primeira Guerra Mundial, e neste pequeno recorte temos o núcleo de trabalhadores do filme; a mulher preta e sua família ainda ocupam os mesmos lugares da escravidão, temos também o mordomo Tanaka, onde provavelmente imigrou do Japão no Kasato-maru, e Helga, A Fraülein (Elza, no livro), possivelmente uma imigrante buscando oportunidades durante e no pós-guerra.
Além disso, o diretor escolhe ser formalista ao optar por uma filmagem clássica com a câmera estática que no máximo acompanha os atores, sem explorar ângulos muito elaborados, sendo assim, este incômodo acaba sendo inventivo, pois o realizador acaba colocando a câmera sempre em cima de Helga (Elza, no livro) em um discreto plongée, para reforçar o seu argumento de que todos olham para ela de cima para baixo. Isto é, plongée, do francês, significa “mergulho“ e a ideia desta técnica cinematográfica, é fazer um enquadramento de cima para baixo, como se a câmera fosse mergulhar e Escorel aplica esporadicamente isso em seu filme, em determinada cena acompanhamos a protagonista em direção a Matriarca da família, sentada em seu sofá, até o momento em que a mãe se levanta e a governanta senta em seu lugar, aludindo ao Complexo de Édipo, um conjunto de desejos amorosos e hostis que todo menino enquanto ainda criança, nutre pela mãe até se tornar homem. E com isso, observamos outros elementos discretos que o diretor utiliza para nos dar um fôlego ao formalismo, como, por exemplo, algumas digressões da personagem principal são expostas diretamente para a câmera, como se quisesse quebrar a quarta parede. O filme, também brinca com a passagem do tempo ao utilizar a música para transicionar de uma cena para outra, contendo cortes suaves para construir uma ambientação aconchegante, demarcando o tempo passando através das flores do jardim que florescem e somem, como também a evolução ao piano da filha. Desse modo, mesmo o diretor optando por elementos clássicos na construção de sua narrativa, ele explora a metalinguagem com o texto lido e o texto que vemos no filme, por exemplo, o momento em que Carlos lê um poema e ressalta que às duas personagens estão apaixonadas, mas Helga ressalta que das duas, apenas “Ele” nutre amor pela outra personagem.
Assim sendo, a governanta do filme expressa sua visão sobre o amor de maneira racional, ou seja, sincero, prático e livre de excessos, ela afirma que o amor não é apenas o que o senhor Sousa Costa pensa, mas sim algo mais profundo e significativo, sem a filosofia que invadiu o seu terreno, como Schopenhauer e Nietzsche. Como também, ela passa a película inteira tentando ensinar a Carlos um amor mais conciso e consciente, focado na construção do lar, explorando as relações humanas e questões sociais com muita sutileza onde o diretor nos diz que a intenção da governanta ao ensinar as crianças, foi concretizado e em especial, Carlos. E com isso, podemos observar em certo momento do filme a imagem das bonecas jogadas, mostrando que as crianças não são mais as mesmas, elas cresceram e a inocência foi deixada para trás, encerrando o ciclo e iniciando outro, desta forma, dando mais ênfase a cena final de Helga no carro ao se confortar com o reforço que tudo não passa de mais um trabalho para ela e que Carlos, é só mais um numa lista de muitos nomes aos quais ela prestou seus serviços, colocando em evidência como a personagem não deixa de sentir a dor de sua partida mesmo racionalizando que é preciso partir, e deixa-nos com um ensinamento, parafraseando o poeta; é preciso sentir com inteligência e pensar com emoção.
*
✚A COMPARAÇÃO /
Posto essas considerações e de que o leitor já conheça o romance “Amar, Verbo Intransitivo”, partimos para a análise comparativa dos textos que se dá em paralelo, destacando semelhanças e diferenças em relação um do outro, a comparação é utilizada como recurso analítico e interpretativo para a “atividade crítica (...) como motor do comparativismo, diferenciação de fontes/influência e análise crítico-interpretativa da obra centralizada; (...) o texto é o objeto central das preocupações.” (Carvalhal, 2006, p 43). O trabalho comparativo entre o romance “Amar Verbo Intransitivo” e o filme “Lição de Amor” pretende demonstrar as relações de intertextualidade entre as duas obras, abordando suas diferenças e semelhanças, partindo da perspectiva que:
“A literatura comparada é o estudo da literatura além das fronteiras de um país específico e o estudo das relações entre, por um lado, a literatura, e, por outro, diferentes áreas do conhecimento e da crença, tais como as artes (por exemplo, a pintura, a escultura, a arquitetura, a música), a filosofia, a história, as ciências sociais [...] as ciências, a religião etc. Em suma, é a comparação de uma literatura com outra ou outras e a comparação da literatura com outras esferas da expressão humana” (Remak, 2011, p. 189)
Sendo assim, mesmo que às duas obras partam da mesma premissa, elas exploram diferentes dimensões do amor e afeto, o trabalho de adaptação Escorel em “Lição de Amor”, fornece reflexões importantes em relação às diferentes possibilidades e limitações entre a mídia impressa e o audiovisual. E com isso, é possível analisar que recursos de linguagem serão trabalhados de forma diferente em cada uma das propostas, pois enquanto o primeiro irá se limitar a linguagem escrita, o segundo poderá lidar com uma gama maior de alternativas audiovisuais; porém, terá que lidar com as limitações de tempo, visto que o tempo de consumo entre as duas mídias se faz diferente, dando vantagem para o romance; logo, faz-se pertinente salientar a afirmação de Souriau:
“Com efeito, não esqueçamos isto, que é essencial: quaisquer que sejam as similitudes que possamos encontrar, por exemplo, entre uma melodia e um arabesco decorativo, entre uma combinação de cores e um acorde musical... nem o músico, nem o desenhista ou o pintor, entretanto, as desejaram ou procuraram. O músico pensou musicalmente, o pintor plasticamente...” (1983. p. 31)
Portanto, é justo pensar que um processo semelhante à tradução literária sempre é feito durante a transposição de uma mídia para outra — perde-se algo, ganha-se algo, e segundo o crítico Jean-Claude Bernardet (1936), ao financiar produções, via embrafilmes, de adaptações da literatura brasileira, a ditadura militar pretendia ganhar “um cinema de prestígio cultural”,ou seja, sem o apelo sexual das pornochanchadas ou o “caráter crítico” dos filmes do Cinema Novo.
Pois bem, publicado em 1927, “Amar Verbo Intransitivo” segue a mesma premissa de sua adaptação cinematográfica “Lição de Amor” de 1975, porém, aprofunda-se melhor no desenvolvimento dos seus personagens, trazendo outras situações e discussões que não são aprofundados ou não estão presentes na película de Escorel, pois, devemos considerar que uma adaptação cinematográfica é a transposição de uma obra literária para o formato fílmico, este processo envolve a transfiguração dos elementos textuais para elementos audiovisuais, além daquilo que é da sua própria narrativa.
Em “Amar, Verbo Intransitivo”, há em essência os pressupostos básicos do “modernismo”, a crítica aos ideais europeus, cultivar as tradições e costumes do Brasil, muito disso se dá ao acentuar como cada personagem fala diferente, aqui Andrade visa a integração de todas as frentes imigradas ao Brasil, suas tradições e culturas sendo devoradas pela cultura brasileira. Mário de Andrade, lida com questões sociais pertinentes para sua época de publicação, tais como os efeitos da Primeira Guerra Mundial na sociedade brasileira, onde o convívio de imigrantes alemães, italianos e japoneses se enraizou na já complexa e heterogênea composição populacional do país; o que explica a presença de personagens como Elsa (Helga, no filme) e Tanaka (que trataremos a seguir), bem como da “pretinha” Marina; peças do cenário nacional marcado pela desigualdade social e pela ascensão de famílias burguesas, tão bem representada pelos Costa Sousa. Sendo assim, ainda na visão de Mário, personagens como Fräulein apresentam muito mais de seus anseios e visão de mundo; onde suas contradições como indivíduo são visitadas constantemente pelo leitor, por intermédio de relatos fornecidos pelo narrador, que permitem uma viagem do leitor as camadas mais internas da psique da alemã, escancarando conflitos entre emoção e razão que impregnam todos os âmbitos de sua vida, desde sua visão sobre a arte, até sobre o amor, onde o estereótipo da frieza germânica se contrapõe aos anseios enquanto pessoa.
Além disso, como fruto do nome mais importante da Primeira Fase do Modernismo brasileiro, não é de se surpreender que o romance traga tantas experimentações estéticas como o coloquialismo, tanto quanto críticas à produção literária da época, por intermédio das falas metalinguísticas do narrador.
No entanto, mesmo que o foco tanto de “Amar, Verbo Intransitivo” quanto “Lição de Amor” ainda resida na governanta, nota-se que o romance propõe discussões mais extensas do que a versão sobre a complexidade das relações humanas proporcionadas pelo verbo “amar”, não se limitando ao conceito de amor romântico, fornecendo, por exemplo, um aprofundamento maior nas relações entre os Sousa Costa, lidando relatos mais específicos sobre o amor materno, paterno e fraterno; para isso leva-se em consideração, para analisar a versão fílmica, uma curadoria de elementos da obra original que serão transpostos e como eles serão retratados em tela, personagens e temas do livro original, ou seja, entre “Lição de Amor” e “Amar, Verbo Intransitivo”, Escorel escolheu focar na adaptação do amor, numa representação formal do texto de Andrade em tela, ignorando o viés transgressor da obra original, mas preservando a essência da obra literária, ao mesmo tempo, em que se adapta às peculiaridades da linguagem cinematográfica.
Porém, dos elementos do livro que não foram adaptados, transcritos ou mencionados na adaptação, é possível observar as diferenças entre as duas propostas de cada obra logo em seus devidos títulos, pois enquanto “Amar, Verbo Intransitivo”, propõe uma das muitas reflexões metalinguísticas que se farão presentes durante todo o romance, “Lição de Amor” irá remeter ao recorte que será feito do material fonte, priorizando a relação entre Helga (Elza, no livro) e Carlos, pois “Amar, verbo Intransitivo” não explora apenas os pensamentos internos dos personagens, mas detalhes complexos da trama e da conjuntura político-sociocultural de sua feitura, enquanto “Lição de Amor” busca pela narrativa concisa e direcionada. Sendo assim, Escorel escolhe finalizar o filme com a Governanta, em uma cena em que remete o começo do filme, não explorando em nada o desfecho do romance em que Elza encontra com Carlos após saída da residência da família Souza Cruza; essa opção do cineasta acaba por transmitir um senso maior cíclico da vida da alemã.
Outro ponto que vale a pena ser ressaltado, e já citado anteriormente, Andrade aprofunda-se muito mais nas personagens, enredo e discussões, e para isso utiliza-se de um narrador, que tal como observado por Lopez em “Um idílio no modernismo brasileiro”, funciona como alterego do próprio autor, o que se alinha com o conceito de “Autor Onisciente Neutro” de Norman Friedman (2002), principalmente por ser uma voz que está longe da cena, permitindo que o leitor acesse todos os ângulos da história, tal como a mente e sentimento tanto das personagens quanto do próprio autor, o qual faz “intromissões e generalizações autorais sobre a vida, os modos e as morais, que podem ou não estar explicitamente relacionadas com a estória à mão” (Friedman, 2002, p. 173).
É interessante notar, como todas as principais diferenças entre romance e filme são motivadas por esse narrador, tão presente no material fonte, fazendo-se presente durante toda a história, trazendo ao leitor todo tipo de informação, tanto sobre os personagens, quanto sobre o mundo a sua volta. Para ilustrar esse fenômeno narrativo, é válido tratar a difícil relação entre Elsa e Tanaka, a qual é bem melhor desenvolvida dentro das páginas do que em tela, onde o narrador faz um corte brusco pouco antes de Carlos ter sua primeira experiência sexual com Elsa, trazendo maiores detalhes entre os dois empregados dos Sousa Costa, abordando as questões hierárquicas e raciais que motivam a relação de rivalidade entre os dois, mas que também é marcada pelo senso de solidariedade por ambos se reconhecerem como imigrantes.
Tomoo Handa/Autorretrato/1945/Óleo sobre tela |
A Colheita de Café, 1955/Tomoo Handa/Óleo sobre tela |
Capa do catálogo do 1º Salão de Maio, 1937/Acervo Fundação Itaú |
Isto é, não afirmamos que Andrade representou a figura de Handa em seu romance, mas ele registrou o movimento de seus correligionários no texto, veja:
Com o passo enluvado, cauteloso, ele rondava à espera dum carinho. E o carinho chegava fatalmente. Fräulein, fingindo indiferença, fechava o livro.
– Muito serviço, Tanaka?
– Nem tanto, senhora, êêê... na terra era pior.
– Você é de Tóquio?
– Êê... senhora, não.
Se aproximava. Vinha felinamente estacar em frente do tigre germânico. (Andrade, 1927, pág, 55)
Fica evidente que nas falas do mordomo “Nem tanto, senhora, êêê... na terra era pior”, vemos uma clara referência ao movimento migratório dos jovens japoneses aos quais descrevemos. Não obstante da figura de Handa, a própria relação de Elsa com a comunidade alemã no Brasil é muito mais explorada, trazendo ao leitor um panorama do contexto intelectual da época, além de maiores detalhes sobre as inovações artísticas do momento, como o Expressionismo e o Modernismo e como essas ideias impactaram a protagonista, contribuindo com a construção da mesma:
Fräulein quase nada sabia do Expressionismo nem de modernistas. Lia Goethe, sempre Schiller e os poemas de Wagner. Principalmente. Lia também bastante Shakespeare traduzido. Heine. Porém Heine caçoara da Alemanha, lhe desagradava que nem Schopenhauer, só as canções. Preferia Nietzsche, mas um pouquinho só, era maluco, diziam. Em todo caso Fräulein acreditava em Nietzsche. Dos franceses, admitia Racine e Romain Rolland. Lidos no original.
Seguiu página por página livros e revistas ignorados. Compreendeu e aceitou o Expressionismo, que nem alemão medíocre aceita primeiro e depois compreende. O que existe deve ser tomado a sério. Porque existe. Aquela procissão de imagens afastadíssimas, e contínuo adejar por alturas filosóficas metafísicas, aquela eterna grandiloqüência sentimental... E a síntese, a palavra solta desvirtuando o arrastar natural da linguagem... De repente a mancha realista, ver um bombo pam! de chofre... Eram assim. Leu tudo. E voltou ao seu Goethe e sempre Schiller.
Se lhe dessem nova coleção de algum mensário inovador, mais livros, leria tudo página por página. Aceitaria tudo. Compreenderia tudo? Aceitaria tudo. Para voltar de novo a Goethe. E sempre Schiller. (Andrade, 1927, pág, 32-33)
Por certo, o autor utiliza todo seu arcabouço teórico e artístico para tecer críticas pontuais à mentalidade do povo alemão, por frases como “Compreendeu e aceitou o Expressionismo, que nem alemão medíocre aceita primeiro e depois compreende.” ou “Aceitaria tudo. Compreenderia tudo? Aceitaria tudo. Para voltar de novo a Goethe. E sempre Schiller”.
Todavia, a relação íntima que o narrador constroi com o leitor é importantíssima para discutir as crenças modernistas do autor, tornando difícil a diferenciação entre narrador e seu idealizador, a tal nível de subjetividade que torna inviável imaginar uma adaptação cinematográfica que pudesse simular tais relações, devido não somente as limitações do formato cinematografico, mas a própria fluidez e pertinência de algumas minúcias dos fatos sócio-históricos e culturais em que a obra original foi publicada, visto que “Lição de Amor” foi lançado anos após a Segunda Guerra Mundial, o que pode explicar a opção de Escorel em não se ater tanto a certas datas e discussões mais específicas sobre imigrantes como Tanaka e Fräulein.
*
✚CONCLUSÃO /
Nesta investigação, podemos ressaltar a dualidade das formas de linguagem visual e textual, tal qual como ambas contribuem para a narrativa sobre as relações em suas diversas instâncias, pois “Nada vive isolado, todo mundo empresta a todo mundo: este grande esforço de simpatias é universal e constante.” (Chasles apud Carvalhal, 2006, p. 10). Portanto, entre a tela e as páginas consideramos as diferentes abordagens; a sociedade retratada na época, seus preconceitos e valores, ambas abordadas nas duas obras, assim como, cada personagem com suas particularidades e desenvoltura, deixando em evidência seus conflitos internos e externos. E com isso, “A comparação, mesmo nos estudos comparados, é um meio, não um fim.” (Carvalhal, 2006, p. 07) observamos, semelhanças à parte, cada obra é capaz de transmitir, ou melhor, repercutir em nossas reflexões que não se esgotam, mas proliferam tão complexas quanto o mundo que representam artisticamente. Por isso, através do processo de intertextualidade, Escorel não esgota a discussão iniciada por Andrade, mas a adapta para o contexto de seu próprio tempo, optando por ressaltar aspectos que ainda se fazem pertinentes, como a universalidade do amor, o papel da mulher na sociedade e a desigualdade social, reforçando a noção de Kristeva de que “todo texto é absorção e transformação de outro texto. [...]” (2005, p. 68); sendo assim, o diretor faz um recorte do romance andradiano, e o potencializa através dos recursos disponíveis pela linguagem cinematográfica, propondo sobre um novo olhar sobre a obra, o incutindo de subjetividade, demonstrando como “toda repetição está carregada de uma intencionalidade certa: quer dar continuidade ou quer modificar, quer subverter, enfim, quer atuar com relação ao texto antecessor. A verdade é que a repetição, quando acontece, sacode a poeira do texto anterior, atualiza-o, renova-o e (por que não dizê-lo?) o reinventa”. (Carvalhal, 2006, p. 53-4).
Em suma, esta análise sobre as obras nos leva a um exercício teórico para compará-las, não para uni-las, mas para que se complementem uma a outra trazendo discussões e propondo diferentes olhares para o mundo, pois tanto livro quanto filme, não acabam quando terminam.
***
***
BIBLIOGRAFIA
LIÇÃO de Amor. Direção: Eduardo Escorel. São Paulo. LC Barreto Produções Cinematográficas, 1975. DVD. 80min.
ANTUNES, Benedito. A Fuga do Intelectual em Amar, Verbo Intransitivo. In: PIRES, A. D. Na festa de nosso irmão Macunaíma. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2022.
BERNARDET, Jean-Claude. Adaptações: nem foi preciso medidas violentas. Última Hora, São Paulo, p. 14, 24 jul. 1978.
CARVALHAL, Tania. Literatura Comparada. São Paulo: Ática, 2006.
ESCOREL, Eduardo. Num país como o nosso, o fazer é uma forma de ação útil. Opinião, São Paulo, p. 20, 7 maio 1976.
ÉTIENNE, Souriau. A Correspondência das Artes: Elementos de Estética Comparada. São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo, 1983
FERRAZ, Daniel de Mello; TOMIZUKA, Gabriela Hiroko. Cinema e Letramento Visual em Aulas de Línguas Estrangeiras. Policromias, v. 6, n. 1, p. 389-419, 2021.
FRIEDMAN, Norman. O Ponto de Vista na Ficção - O Desenvolvimento de um Conceito
Crítico. Revista USP, São Paulo, n.53, p.166-182, março/maio de 2002.
KOMOREBICAST: Episódio: #25 - Especial Imigração: Uma homenagem a Tomoo Handa. Anna Ligia Pozzetti. Local: Komorebi Translations, 05/05/2024.
LEVY, Maria Stella Ferreira. O papel da migração internacional na evolução da população brasileira (1872 a 1972). Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 8, suplemento, p. 49-90, 1974.
LIÇÃO de Amor. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2024.
LOPEZ, Telê Porto Ancona. Um Idílio no Modernismo Brasileiro. In: ANDRADE, Mário de. Amar, verbo intransitivo: idílio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013a. p. 159-174.
REMAK, Henry. Literatura Comparada: Definição e Função. In: COUTINHO, Eduardo; CARVALHAL, Tania. Literatura Comparada: Textos Fundadores. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio Sobre a Análise Fílmica. 7 ed. Campinas, SP: Papirus Editora, 2012.
KRISTEVA, Julia. Introdução à Semanálise. Trad. Lúcia Helena França Ferraz. 2ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.
ANTUNES, Benedito. A Fuga do Intelectual em Amar, Verbo Intransitivo. In: PIRES, A. D. Na festa de nosso irmão Macunaíma. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2022.
BERNARDET, Jean-Claude. Adaptações: nem foi preciso medidas violentas. Última Hora, São Paulo, p. 14, 24 jul. 1978.
CARVALHAL, Tania. Literatura Comparada. São Paulo: Ática, 2006.
ESCOREL, Eduardo. Num país como o nosso, o fazer é uma forma de ação útil. Opinião, São Paulo, p. 20, 7 maio 1976.
ÉTIENNE, Souriau. A Correspondência das Artes: Elementos de Estética Comparada. São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo, 1983
FERRAZ, Daniel de Mello; TOMIZUKA, Gabriela Hiroko. Cinema e Letramento Visual em Aulas de Línguas Estrangeiras. Policromias, v. 6, n. 1, p. 389-419, 2021.
FRIEDMAN, Norman. O Ponto de Vista na Ficção - O Desenvolvimento de um Conceito
Crítico. Revista USP, São Paulo, n.53, p.166-182, março/maio de 2002.
KOMOREBICAST: Episódio: #25 - Especial Imigração: Uma homenagem a Tomoo Handa. Anna Ligia Pozzetti. Local: Komorebi Translations, 05/05/2024.
LEVY, Maria Stella Ferreira. O papel da migração internacional na evolução da população brasileira (1872 a 1972). Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 8, suplemento, p. 49-90, 1974.
LIÇÃO de Amor. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2024.
LOPEZ, Telê Porto Ancona. Um Idílio no Modernismo Brasileiro. In: ANDRADE, Mário de. Amar, verbo intransitivo: idílio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013a. p. 159-174.
REMAK, Henry. Literatura Comparada: Definição e Função. In: COUTINHO, Eduardo; CARVALHAL, Tania. Literatura Comparada: Textos Fundadores. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio Sobre a Análise Fílmica. 7 ed. Campinas, SP: Papirus Editora, 2012.
KRISTEVA, Julia. Introdução à Semanálise. Trad. Lúcia Helena França Ferraz. 2ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.