Pular para o conteúdo principal

CINEMAGIA - REBOBINE, POR FAVOR!

Sinopse: Revivendo a era das videolocadoras, Chuck, fala sobre o documentário que homenageia os templos da sétima arte, os quais moldaram gerações e resistiram às mudanças tecnológicas, assim celebrando a magia do cinema em casa e a importância dessas lojas na cultura cinematográfica brasileira.


CineMagia: A História das Videolocadoras de São Paulo/Lumolab/Divulgação
CINEMAGIA: A HISTÓRIA DAS VIDEOLOCADORAS DE SÃO PAULO - REBOBINE, POR FAVOR
O que define você hoje faz parte de um amontoado de lembranças, e eu andei lembrando de um monte de coisas, sensações, cheiros e afins. Reparei que muitas das minhas memórias envolvem videolocadoras.
Você se lembra da primeira vez que entrou numa videolocadora?
Dependendo da sua resposta, nem vou me atrever a perguntar se você se lembra da última vez que entrou n’uma. Bom, eu não me lembro ao certo da data, mas lembro-me de como foi. Era uma sexta-feira quente em Centreville, eu estava na casa da minha avó quando meu pai veio me pegar para irmos para casa. No caminho, atravessamos um determinado córrego poluído, “manancial” para a prefeitura. Inalei com desgosto o mau cheiro enquanto lançava, com prazer, uma pedra nas águas só para vê-la cair e ouvir o splash! Não sei por que fazia isso, mas sei que Freud explicaria e constataria que isso me fez ser o homem cheio de manias que sou hoje. T.O.C.
Enfim, deixando o devaneio de lado, ao atravessarmos a ponte, percebo que meu pai pegou outra direção. “Vamos passar na casa de um amigo meu”, ele disse. Alguns minutos depois, estávamos em um estabelecimento todo trabalhado em “tema escuro”, mas com muitas prateleiras coloridas. Eu nunca vou esquecer as palavras mágicas que voaram da boca do meu pai:
— Escolhe um filme…
Isso ocorreu numa época anterior ao streaming, quando existia o que nós chamávamos de videolocadoras, e elas foram fundamentais para o início da experiência cinematográfica de muita gente. Por exemplo, a minha. Fui primeiro a uma videolocadora, em vez de ir ao cinema.
Nunca esqueci de fato essa lembrança, mas ela veio forte ao assistir CineMagia: A História das Videolocadoras de São Paulo, documentário de 2017, dirigido por Alan Oliveira. O filme, obviamente, narra a história das videolocadoras na cidade de São Paulo, onde o recorte se dá desde o seu surgimento, passando pelo apogeu e chegando a queda. Contando com depoimentos de fundadores de mais de vinte lojas, funcionários, clientes, vendedores, críticos de cinema e distribuidores, a fita revela os personagens, acontecimentos e a experiência de locar um filme e ter seu “cinema em casa” no Brasil dos últimos 40 anos _ É, agora você sabe de onde surge o nome da sessão de filmes da antiga T.V.S ;). Celebrando o cinema, a gênese das fitas VHS, a glória dos DVD’s e do natimorto Blu-Ray, o filme pontua a importância do trabalho de profissionais que resistiram e resistem às inúmeras transformações do setor. O filme traz relatos repletos de amor, paixão e dedicação pelo cinema, pelo ofício ao qual se dedicaram, sem deixar de lado, claro, que também era um negócio muito lucrativo.


CineMagia abre com uma sequência em animação feita com traço minimalista e sensível. Logo de cara, nos joga ao passado glorioso das locadoras e, tão rápido quanto, sem pensar duas vezes, ainda imerso em lembranças, o documentário te choca com relatos de pessoas que não sabem o que é uma videolocadora ou que têm uma vaga noção do que é essa maravilha. Elas desconhecem que antes de se perder horas escolhendo o que assistir no catálogo do seu app de streaming favorito, você fazia isso em uma loja, longe do aconchego do lar. 


Uma outra coisa: naquele dia, na locadora escura, meu pai escolheu um filme facilmente. Não sei qual filme ele escolheu, mas sei que o fascínio estava evidente nos meus olhos, e a indecisão reinava até eu me deparar com um estojo preto com detalhes em vermelho e amarelo que saltavam aos olhos. O estojo tinha um relevo bonito de figuras assustadoras. Fiquei fascinado com aquilo, parece que fiquei admirando aquela peça, aquela obra de arte, por muito tempo. Minha excitação só aumentou quando meu pai disse: “É feito com osso de dinossauro de verdade”.
Sem pensar duas vezes, levei o filme.
Essa embalagem foi trazida para o Brasil por Marcos Rosset, que está no documentário ao lado de grandes nomes como Rubens Ewald Filho e Christian Petermann. E, mesmo apesar dos pesares, eu cresci consumindo o trabalho de ambos, e foi muito legal revê-los em tela, pois ambos estão falecidos. Outra coisa legal vem da narrativa do filme. O protagonista Adelino dos Santos Abreu, vulgo Ghaba, não tem depoimentos, pois já era falecido na feitura do filme, e mesmo assim temos na tela sua presença do começo ao fim. Ele foi pioneiro dos vídeo clubes e, a posteriori, das videolocadoras com contrabando de VHS vindo do exterior, passando pela chegada do DVD, renovando assim o fôlego do mercado e se deparando com os Assaltos de Marcha à Ré. (Não sabe do que se trata? Então dá o play no filme).
A sinopse de CineMagia é simples: um documentário que conta a história do surgimento das principais videolocadoras da cidade de São Paulo. Apesar de simples, há uma necessidade de documentar uma parte da história do cinema, tanto nacional quanto mundial. As futuras gerações poderão saber que a magia do cinema não cabe apenas nas salas de exibição, mas também em levar um filme para casa e deixá-lo fazer parte da sua história e da história de outras pessoas. Ir a uma locadora foi uma experiência socializante, poder conversar com outra pessoa que assistiu ao mesmo filme ou com o atendente que sabe exatamente o que te recomendar. As videolocadoras foram um fenômeno poderoso.
Sem dúvida, o documentário é muito gostoso de se assistir, mas também não é um filme perfeito. Um aspecto negativo do filme, talvez o único, vem da minha expectativa de querer algo mais contemplativo e menos expositivo. Falta aquele momento para que o espectador possa respirar e pensar sobre o que acabou de ouvir, ver e sentir. E falando em sentir, eu senti falta dos clientes. Sim, houve alguns, mas a ocorrência dos frequentadores das videolocadoras poderia ser um pouco maior. Os cem minutos de projeção voam, por isso acredito que alguns minutos a mais não seriam um problema.
CineMagia: A História das Videolocadoras de São Paulo é um filme necessário, que, apesar de voltado a um nicho, pode agradar também ao grande público na busca de boas experiências cinematográficas. Já o estojo de VHS que comentei simulava um fóssil de dinossauro, e ele foi pensado especialmente para as videolocadoras brasileiras, para impulsionar as locações. E funcionou. Marcos Rosset, na época diretor da CIC Vídeo, comentou em entrevista cedida para a revista VerVídeo em noventa e três: “Acreditamos que essa embalagem irá funcionar como um atrativo a mais para o consumidor.” Com base no meu relato, ele estava certo. Hoje, esse estojo é muito cobiçado por colecionadores.
Lembrando daquele momento, naquele estabelecimento em meio às prateleiras coloridas, no momento em que meu pai disse “Escolhe um filme” e soltou minha pequena mão rechonchuda, ele fez um novo mundo se abrir para mim, fez a magia do cinema me contaminar e definir quem eu sou hoje. Cinéfilo e pesquisador.
Sobre o estojo, cinéfilo ou não, todo mundo reconhece esse e sabe de que filme era a fita que estava dentro. E isso é assunto para uma outra oportunidade.
Sobre CineMagia, assista sem falta!
*


✚Se ficou interessado: ASSISTA CINEMAGIA
✚Comentários, dicas e sugestões: ENTRE EM CONTATO
✚Curtiu e quer ver a gente melhorar? ENTÃO NOS APOIE /


Saiba mais sobre a produção do filme que conta a história das principais videolocadoras da cidade de São Paulo! Confira o making of do documentário "CineMagia" na íntegra e veja os depoimentos exclusivos do diretor do longa e sua equipe. 


Licença Creative Commons
 
👇Acesse GRÁTIS por 30 dias e divirta-se!👇
     

✚ CONTEÚDO QUE VOCÊ PODE GOSTAR 👇

De Repente 30 - O Que Você Vai Ser Quando Crescer?

  Sinopse: Neste texto Chuck tece uma reflexão sobre a vida adulta e o fatídico momento da vida em que de repente 30.

LOOK BACK - Três Minutos Podcast #040

  Sinopse: Neste episódio, Chuck fala sobre o filme/mangá Look Back e o que influencia a socialização dos jovens. Além disso, rola uma crítica sobre a representação feminina no cinema com base nos filmes de Christopher Nolan . Passa ou não no Teste de Bechdel ? Ouça!

Emmanuelle — Sexualidade Como Arte e Prazer (Não Como Pecado) 🔞

  Sinopse: Neste texto costuro Emmanuelle , Vladimir Lenin e arte japonesa tentando discutir a sexualidade como arte e prazer, não como pecado.

Borat 1, 2 e também a série (as duas, na verdade) — Escolha Sua Verdade e a Passe Adiante

  Sinopse:  Uma analise sintética sobre a produção de fake news no Brasil e a franquia do segundo melhor repórter do glorioso pais Cazaquistão, Borat Margaret Sagdiyev. Very nice!

Jamaica Abaixo de Zero — Apropriação Cultural Baseando-se em Fatos Reais

Sinopse: Exibido menos que outros clássicos na Sessão da Tarde , foi um sucesso do cinema e um dos VHS mais alugados no auge das Locadoras de Vídeos , discutindo um pouco sobre apropriação cultural e culinária aproveito para falar sobre o clássico.